Quando alguém está em sofrimento psíquico, com algum incômodo ou dúvida incessante, quer ajuda para seus problemas e pouco se importa com o que é que lhe ajudará, contanto que a ajude. Até aqui aparentemente nenhum problema.
Contudo, há uma boa diferença entre algumas psicologias e a psicanálise que vale a pena olhar mais de perto: algumas psicologias pensam muito mais num debruçar-se sobre os sinais e sintomas apresentados pela pessoa que procura o psicólogo. Isto significa ater-se ao sintoma e querer extirpá-lo, como se ele não tivesse relação com a pessoa, como se fosse um corpo estranho que adentrou na psique ou no comportamento, um intruso impessoal e desconectado daquele humano. Já a psicanálise vai buscar a compreensão de como esta pessoa funciona e como o que lhe aflige se constituiu em sua história singular de vida. A narrativa da história e a atualidade da vida são levadas em conta: o que são estes sintomas, o que eles estão dizendo de forma torta, mal-dita, e produzir a partir daí uma narrativa mais próxima de um bem-dizer (bem-dizer que vai muito além do Eu, é importante frisar).
E por que saber isto pode ajudar um leigo que está lendo o presente texto?
Defendo aqui uma posição de que sinais e sintomas não são um fim em si mesmos, pois estão interligados a diversas áreas da vida humana e tampouco aparecem por geração espontânea. Desta forma, apaziguar o sintoma rapidamente pode, à primeira vista, ser uma boa opção para um leigo, mas se o real problema que levou a formação deste sintoma permanece intocado, logo poderão surgir outros sintomas ou, o que também é ruim, a pessoa ficará dependente do psicólogo para um eterno apaziguamento – que em algum momento certamente irá falhar, pois não há apaziguamento que resista indefinidamente, e aí a coisa pode ficar realmente feia.
Mas então… o que a psicanálise propõe no lugar? Ficar sofrendo???
Não, de maneira alguma! O que uma boa psicanálise propõe é que o sujeito fale livremente. Parece pouco, não? Veremos! Ao falar livremente, a pessoa fala de sua história (singular) e, sem que tenha consciência disso, expõe a forma como se posiciona em seu próprio discurso. A partir disso, um analista pode fazer intervenções que possibilitem ao analisando fazer um movimento de se questionar sobre o que ele, o analisando, tem a ver com o que ele mesmo faz e vive (seus sintomas). Ou seja, um primeiro movimento em análise é que a pessoa faça uma articulação em que reflita sobre o que é este estranho (o sintoma, a repetição, etc) que parte dela própria, que acontece via suas próprias mãos, sua própria boca, sua própria expressão, mas que ela considera nada ter a ver consigo.
Ora, como algo originado da própria pessoa pode não ter a ver com ela mesma? Isto significa entrar no campo da responsabilização pelos próprios atos e sair da culpabilização por eles (culpabilização de si próprio ou, mais comumente, dos outros pelo que acontece)! Parece contraditório, não? Mas isto fica claro no que acontece em seguida: ao iniciar esta reflexão (que pode demorar um bom tempo para começar, sendo um tanto dolorosa às vezes), observa-se na clínica que muitos sintomas podem diminuir e pode haver mudanças! Ao sair do martírio da culpabilização e entrar no campo da responsabilização pelo que se faz a si próprio ou do que fazer com o que os outros fizeram com ele, o analisando começa um trabalho investigativo sobre si próprio, mas como protagonista agora, com resultados (estes sim secundários) de reduzir seus sintomas, pois começa a falar, por em palavras, ao invés de desenvolver sintomas. E algo ainda mais interessante acontece: este trabalho investigativo pode produzir saberes sobre si próprio, pois relacionados a pessoa como um todo, logo, podendo produzir efeitos sobre diversas áreas da vida. Ou seja, é um trabalho que não se esgota no sintoma, ao contrário, que vai muito além dele e que produz algo duradouro, que vai além do consultório e permanece para a pessoa.
Isto é apenas o comecinho, o início de um processo que busca uma mudança de posicionamento radical. Não vou aprofundar mais, por hora não vem ao caso já que este (longo) texto busca apenas responder o porquê de minha escolha pela psicanálise e não por outras linhas teóricas!